Imagem colhida na internet |
Hoje cedo fui em uma lojinha do tipo bugigangas "made in China", onde se vende de tudo que é quinquilharia, inclusive capinhas para celulares. A loja é de evangélicos, equipada com som ambiente: música gospel troando na alta.
A atendente, muito educada, me recebeu na entrada com largo sorriso e, gentilmente, me ajudou a localizar a peça e a escolher o modelo. Pretendia comprar capinha de celular e colocar a película de vidro no aparelho. Escolhida a capinha, perguntei o preço:
- Quanto tá custando esta capinha?
- Vinte reais, respondeu a vendedora (com muita educação).
Achei o preço razoável, então perguntei:
- Aqui passa cartão?
- Passa. No débito fica em vinte e sete reais, respondeu a educada vendedora.
Tomei um susto. Procurei terra embaixo dos pés e nada. Fui longe em meus pensamentos, refletindo sobre a realidade econômica do brasileiro trabalhador pós-golpe e na era da “arminha de mão”: investimentos em saúde, educação, área social e segurança pública congelados; o meu salário também congelado, uma verdadeira pedra de gelo no meio do deserto do Saara, derretendo acelerado; valor da cesta básica na estratosfera; talões de água e luz um assalto; gás de cozinha um roubo, gasolina uma fortuna o litro… E por aí vão os preços de produtos e serviços de primeira necessidade, enquanto nossos salários descambam ladeira a baixo.
Me recusei pagar aquele preço. Não é justo. Dou valor aos meus "caraminguás". Declinei da compra e fui saindo da loja, muito discretamente, fazendo cara de paisagem abstrata. Enquanto praticava meu plano de fuga – aquilo era um assalto, no meu entendimento, e eu precisava fugir -, a vendedora me olhava contemplativa (e certamente que também fula da vida), e muito provavelmente pensava: este é um lascado. Não estava de todo errada.
O pior ainda estava por vir, para coroar a humilhação. Aí aconteceu o inimaginável neste exato instante. Pasmem só, minha sandália havaianas - um dos lados - quebrou o cabeçote da correia, ainda quando eu estava no meio da loja, me dirigindo à porta de saída do estabelecimento!
Novamente faltou chão embaixo dos meus pés. Melhor: faltou mesmo foi uma sandália de qualidade e em condições de uso (ou um prego para improvisar um remendo na surrada sandália).
Decidido, sem deixar me abater pela situação, ergui a cabeça, pois tinha a certeza que a vendedora continuava a me olhar, agora naquela situação vexatória. Não perdi o rebolado e sai andando sem tirar a sandália arrebentada do pé, deixando para trás a capinha e a película, levando na mão apenas meu celular - com o visor trincado -, e o cartão de credito todo 'brefado'. Que situação!
De dentro da loja - com a sandália no pé - olhei para o carro estacionado do outro lado da rua e calculei o tempo para chegar até lá. Eu sentia as pestanas da vendedora arranharem minhas costas quando ela piscava.
Gente, que distância era aquela? Lembrei do profeta Moisés da Bíblia e imaginei: nesta situação, me arranjando com uma sandália quebrada e tentando caminhar, vou levar 40 anos para atravessar esta rua e chegar no carro.
Levantei a cabeça, empinei o nariz, olhei profundo e caminhei com muita dignidade e confiança, com a alça da sandália quebrada já no tornozelo e a base da sandália virada para trás, parecendo um esporão de galo. Me senti um papagaio ziguezagueando na arei quente e sem direção.
Foi foda!
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