Por Cynara Menezes
Debate na Band, campanha 2014 |
Entre todos os candidatos
presentes ao primeiro debate entre os presidenciáveis na rede
Bandeirantes, nem mesmo o pastor evangélico assumidamente de direita foi capaz
de dizer que existe uma ameaça à democracia no Brasil sob o governo do PT.
Nenhum deles falou que o PT defende censura à imprensa. Nem que os índios estão
tomando a terra dos “brasileiros”. Quem fez isso foram dois jornalistas, Boris
Casoy e José Paulo de Andrade, escolhidos pela emissora para fazer perguntas
(ou editoriais disfarçados de perguntas) aos candidatos.
Casoy e Zé Paulo conseguiram
ser mais reaças do que todos ali. Nunca vi, num debate, jornalistas se
comportarem como opositores dos candidatos –no caso, Dilma Rousseff, do
PT, e Marina Silva, do PSB, porque com o tucano Aécio Neves foram só levantadas
de bola para ele cortar. Nunca vi, num debate, um jornalista fazer pergunta
para um candidato criticando outro concorrente. Sobriedade mandou lembranças.
Mas o que mais me espantou é
que nem Dilma nem Marina e nem mesmo Luciana Genro, do PSOL, candidatas mais à
esquerda no espectro político, foram capazes de denunciar, de retrucar com veemência,
posturas tão arcaicas quanto às demonstradas pelos dois jornalistas, certamente
com o aval dos patrões.
Colhi algumas das pérolas da
noite, confiram.
De José Paulo para Luciana
com comentário de Dilma:
– A questão indígena,
que até no Rio Grande do Sul se agrava, com índios essa semana fazendo
policiais de reféns. Na Bahia, como ocorreu em Roraima com a Raposa Serra do
Sol, brasileiros trabalhadores estão sendo expulsos da terra onde estavam há
gerações. A crítica à Funai é que só antropólogos determinam a política
indigenista. Recentemente, em audiência na Câmara, o ministro da Justiça
falou em fortalecimento da Funai, mas até agora nada se fez. A pretexto de
incluir os excluídos, exclui-se os incluídos. Candidata, somos ou não
iguais em direito? Qual seria sua política indigenista?
De José Paulo para Aécio com
comentário de Dilma:
– O governo federal
criou por decreto o Conselho de Participação Social. É uma instância direta
vista com apreensão por muitos setores: seria uma ameaça ao Congresso Nacional
e consequentemente ao equilíbrio institucional. Seria uma bolivarização do
Brasil nos moldes chavistas e agora a própria candidata acaba de lançar a
ideia de um plebiscito para fazer a reforma política, o que, me parece,
deixa de lado o Congresso Nacional. Como o candidato vê a movimentação dessas
peças no tabuleiro político?
(Aécio, é claro, surfa na
onda da “preocupação” em “garantir a democracia”, mas Dilma dá uma boa
resposta: “É estarrecedor que se considere plebiscito algo bolivariano. Então a
Califórnia pratica o bolivarianismo.”)
De Boris para Marina com
comentário de Aécio:
– Setores da economia
criticam o que classificam, candidata, de seu “radicalismo ambientalista”.
Segundo eles, esse tipo de posição tem criado obstáculos para o desenvolvimento
da economia do país. Citam o exemplo da usina de Belo Monte, que poderia
produzir 11 mil megawatts e, por exigências ambientais consideradas
exageradas, só vão produzir 4 mil. Como a senhora responde a essas críticas?
De José Paulo para Everaldo
com comentário de Aécio:
– Os candidatos de
oposição temem perder votos com posições que não sejam favoráveis à manutenção
dos programas sociais do governo, que acabam sendo cabos eleitorais
importantes, e nisso exageram, prometendo aumentar os benefícios que no
fim vão pesar na carga tributária já elevada, como é o caso da Poupança
Jovem do candidato Aécio. Se há uma justificativa a curto prazo para incluir os
brasileiros menos favorecidos, quando é que vamos ensiná-los a pescar?
(Até o Aécio acha Zé Paulo
reaça demais neste momento.)
De Boris para Eduardo Jorge
com comentário de Dilma:
– Por considerar um
assunto importante e grave, que envolve a liberdade no país, vou voltar à
questão do controle social da mídia. O partido da presidente, o PT,
insiste num plano de censura à imprensa, que eufemisticamente chama de
democratização da mídia. A bem da verdade, a presidente Dilma, a candidata
Dilma, não adotou, criou uma barreira, não tem colocado em prática, apesar da
insistência do partido, essa ideia. Eu queria perguntar: se eleito, o candidato
Eduardo Jorge vai levar esse plano adiante?
(Eduardo Jorge, para riso
geral, diz concordar com Dilma.)
Quando vejo os planos dos
coronéis da mídia para o Brasil, transmitidos por seus funcionários em um
debate supostamente jornalístico e “imparcial”, percebo o quão diferentes são
minhas críticas ao governo Dilma das deles. Percebo o quanto minha ideia, meus
sonhos de País, se diferenciam dos proprietários dos meios de comunicação como
a Rede Bandeirantes.
Critico a Dilma porque ela
precisava ser mais atenta à questão indígena e à ambiental –a mídia acha
que Dilma precisava ser ainda mais permissiva com os fazendeiros e o grande
poder econômico (e o mesmo desejam de Marina).
Critico a Dilma por não ter
concretizado a democratização da mídia, pondo fim à propriedade cruzada dos
meios de comunicação, por exemplo, proibida em vários países. Isso nada tem a
ver com censura –eufemismo quem usa são eles, ao dizer que democratizar a
mídia é censurar. Os donos da mídia não querem a democratização porque temem
perder seu poder, derivado do fato de que menos de uma dúzia de famílias (como
os Saad, da Band) detém a maioria dos meios de comunicação no País.
Aplaudo o PT pelos programas
sociais que incluíram milhões de brasileiros e acho que deve haver cada vez
mais inclusão –a mídia acha os programas sociais, assim como as cotas nas
universidades, desnecessários e excessivos.
Critico o PT por não ter
batalhado mais pela reforma política e aplaudo a iniciativa de propor um
plebiscito para fazê-la –a mídia aponta o plebiscito como
“antidemocrático”, sendo que ouvir a população sobre este tema seria justamente
o contrário. Curioso é que eles são contrários a ouvir a população sobre a
reforma, mas foram a favor de plebiscito para dar direito às pessoas de terem
armas… No fundo, não querem a reforma política porque são contra o
financiamento público de campanha. A mídia sabe que o financiamento privado
favorece os candidatos com maior poder econômico –os seus–, e portanto é
melhor que continue assim.
O País dos reaças da mídia
não me interessa. Ele é pior do que o que temos hoje. Mais injusto, mais
desigual, mais concentrado nas mãos de poucos. Exatamente como a própria mídia.
Fonte: https://mail.google.com/mail/u/0/#inbox/1481e1f12fa24bb3
(socialistamorena.cartacapital.com.br/)