quarta-feira, 27 de outubro de 2010

UMA SAIA VERMELHA NO PODER

Por Antônio Serpa do Amaral Filho

No dia primeiro de janeiro de 2011 uma mulher subirá a rampa do Palácio do Planalto central do Brasil e assumirá o mais alto cargo da República. Quando isso acontecer ninguém mais se atreverá a lançar sobre a dona da saia a pecha de “sapatão”, “guerrilheira” e “matadora de criançinhas’, como disse a mulher do candidato do PSDB. Tudo balela pra ludibriar a atenção dos incautos populares. Na verdade, a maioria dos que votam em Serra não são serristas autênticos, votam no “Vampiro Brasileiro” por fisiologismo, isto é, porque não tem ninguém mais à direita do tucano para merecer o voto desses conservadores. Não são todos, mas uma boa parte é constituída de reacionários travestidos de sociais-democratas de última hora.

Depois de levar três surras seguidas nas urnas, perdendo para Fernando Henrique Cardoso duas vezes e uma vez para Fernando Collor, o PT finalmente emplacou Lula duas vezes seguidas e a agora emplaca vitoriosamente uma mulher, a ex-Ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousself. Ela é filha da ditadura, da classe média politizada e da intelectualidade de esquerda que abdicou de lutar com armas de fogo para lutar com o que têm de melhor: o intelecto privilegiado. É a saia brasileira no poder. A saia norte-americana tentou chegar primeiro à Casa Branca, mas perdeu ponto para Barak Obama. Em sua melhor performance política, Hillary Clinton é hoje Secretária de Estado dos EUA. Um outro rabo de saia também chegou perto do poder na Casa Branca, mas, como todo mundo sabe, Mônica Lewinsky foi lá só pra fazer sexo oral no dono da casa. O poder do falo falou mais alto que a pudica etiqueta da casa de George Washington.

Aos trancos e barrancos o Brasil vem dando saltos históricos: Lula era plebeu, era alienado mas não era ateu; quando veio do nordeste só trazia a coragem e a cara, viajando num pau de arara, mas chegou. Dilma não é plebéia, mas é atéia, tem coragem de mamar em onça, pegou em arma e enfrentou os brucutus da Ditadura Militar de 64, jamais experimentou a fome e tem sobrenome de bacana – Rousselff. E assim, dia 1º de janeiro, um operário passará a faixa presidencial para uma ex-guerrilheira, comandante-em-chefe de uma das mais ricas economias capitalistas do mundo ocidental, o nosso Brasil brasileiro, esse mulato inzoneiro. A cena de posse é a cara do PT, um partido confederativo, catalisador ideológico dos diversos segmentos sociais: a esquerda trotskysta, leninista, cubana, maoísta, a esquerda católica, profissionais liberais, estudantes, campesinos, comunistas, idealistas, ambientalistas, feministas, democratas, sindicalistas, artistas, classe média, excluídos, e até trabalhadores urbanos do ABC paulista, onde a agremiação partidária nasceu e se fortaleceu.

Convenhamos: o programa de trabalho e a prática administrativa do PT não é nenhuma brastemp, é óbvio, mas ainda assim é bem melhor do que a agenda político-administrativa de José Serra e seus camaradinhas neo-liberais. O atual clima eleitoral também não é uma luta do bem contra o mal, nem uma batalha de gênero, o masculino contra o feminino. É a mais humana das atividades sociais posta em ação, segundo o jogo da democracia burguesa: a política, exercitada com vistas à conquista do poder. Para chegar ao poder o PT fez concessões, acordões e mensalões, é verdade, e com isso perdeu substâncias programáticas importantíssimas. O PT não realizou todas as promessas de campanhas, também é verdade, mas ainda assim suas realizações são muitíssimo mais interessantes para o país que as atuais promessas de Serra. Ante ao contexto circundante, em que pese os erros e acertos do Partido dos Trabalhadores no poder, o voto crítico deve se impor e separar o joio do trigo. Serra é Serra e nunca será mais que um político lugar-comum, a serviço de quem sempre mamou nas tetas profanas da pátria. Dilma é Dilma e se revelará uma grande guerreira das transformações, empunhando, agora, as armas da civilização, da legalidade, da democracia e da ação social para promover as mudanças, políticas, econômicas e sociais que as elites vêm adiando desde o clamor da Revolução Praieira nas plagas Pernambucanas.

Ângela Merkel, (Alemanha), Ellen Johnson Sirleaf, (Libéria), e Michelle Bachelet (Chile) à parte, mulher e poder nem sempre dá uma mistura interessante. Dona Maria I, a louca rainha de Portugal, perseguiu impiedosamente o Marquês de Pombal, o déspota esclarecido que revolucionou a administração imperial. A Princesa Isabel posou de marionete da corte ao assinar a Lei Áurea, extinguindo a escravidão, mais para atender aos interesses do capitalismo inglês do que pra fazer justiça à gente de Zumbi dos Palmares. Maria Antonieta mandou o povo francês, descamisado e sem calção (sans cullote), comer brioche, já que não tinha dinheiro para comprar o pão nosso de cada dia. A própria Marta Suplicy mandou o povão relaxar e gozar, em meio à crise nos aeroportos.

Com a mulher Dilma Rousself na presidência da república, porém, a história será bem diferente. Ela carrega consigo a coragem de Anita Garibaldi, o gosto pela guerra de Joana D’arc e a determinação de Olga Benário. Seu coração vermelho vermelhaço vermelhão tem sede de justiça social; seu espírito está impregnado da utopia socialista; sua mente brilhante não estará, creio, a serviço do capital, dos potentados, dos corruptos e dos especuladores, mas a serviço dos que clamam por emprego, saúde e segurança públicas, aposentadoria justa, educação, meio ambiente saudável, transporte público de qualidade, moradia, cultura, lazer e uma boa alimentação, para que o povo brasileiro viva melhor. Viver, aliás, não é preciso. Ver uma saia vermelha no poder, sim, é preciso.

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